“eu aprendi a ensinar e eu aprendi a aprender ensinando, tem muita coisa que eu ensinando, não ia aprender, a liberdade na arte … a arte é uma liberdade!”
A Cerâmica: Uma Tradição Milenar
A cerâmica é uma técnica ancestral que remonta ao período paleolítico, quando o ser humano moldava o barro para atender às suas necessidades diárias e esculpir representações ritualísticas. Ao longo dos anos, essa técnica foi se aperfeiçoando, mas continua fiel às suas duas finalidades principais: a criação de objetos utilitários e/ou decorativos e o retrato do cotidiano. Através de suas peças, os artistas eternizam momentos de observação, retratando pessoas, paisagens e festas tradicionais.
Nesse contexto, nascem os mestres artesãos da cerâmica. Aqui, neste portal, já falamos de outros mestres da cerâmica, como Ana das Carrancas, de Pernambuco, e Dona Izabel, do Vale do Jequitinhonha (MG), entre outras personalidades que encontraram no barro a forma de eternizar e se eternizarem.
Quem é Mestre João das Alagoas
Conhecido como Mestre João das Alagoas, ele é um artesão do Patrimônio Vivo de Alagoas desde 2011 e professor de vários artistas populares que utilizam o barro como matéria-prima. Sua marca registrada são as esculturas do bumba meu boi, adornadas com figuras do folclore alagoano e cenas do cotidiano nordestino em alto relevo. Reconhecido por especialistas como um dos grandes expoentes da arte popular do Brasil, João das Alagoas foi um dos vencedores do Prêmio Sebrae TOP100 de artesanato em sua 5ª edição.
A Trajetória de Mestre João das Alagoas
Desde a infância, João se destacava na escola com seus desenhos e moldava pequenas figuras de bois em barro. Autodidata, ele desenvolveu sua arte de forma independente, aperfeiçoando sua técnica por meio da prática e da observação, e encontrando inspiração em artistas renomados do Brasil, especialmente no mestre Vitalino, sua maior influência.
Origens e Desenvolvimento Artístico
Mestre João Carlos da Silva nasceu em Capela, um município na zona da mata alagoana, originalmente coberto pela Mata Atlântica. É nesse cenário que João encontra inspiração e talento para manter seu ateliê, que se tornou um importante centro de arte popular, abrigando obras de renomados artistas do barro.
João é conhecido pelas cerâmicas do boi bumbá, onde o boi representa cenas do cotidiano. Ele recria o boi do bumba meu boi, peça comum na arte figurativa popular brasileira, esculpindo grandes bois com seus mantos em baixo e alto relevo, os quais representam histórias do folclore nordestino, das brincadeiras de rua, dos casamentos e batizados, especialmente dos festejos de São João. A história de Mestre João repete a de muitos brasileiros. Filho de agricultores, ele cresceu em meio às plantações de cana-de-açúcar e ajudava na produção de panelas de barro, essencial para a fabricação de doces de cana-de-açúcar.
Superação e Dedicação
Na juventude, João enfrentou a resistência do pai com seus dons artísticos, mas encontrou apoio na mãe para continuar. Trabalhou em um supermercado local, mas a arte sempre esteve presente em sua alma. Seu talento foi reconhecido com o tempo, e ele recebeu o apelido de João das Alagoas em uma feira de arte em São Paulo, batizado por Zé Cordeiro, um pintor de pintura primitiva da época.
Evolução Artística
Inicialmente, João não percebia o trabalho no campo como algo a ser retratado em suas peças, focando mais em santos nas pinturas e esculturas. Com o tempo, começou a valorizar o homem do campo, o folclore, os repentistas e os festejos, incorporando essas figuras em seu trabalho. Mesmo assim, seguiu produzindo santos para garantir sua subsistência.
Legado e Ensino
Mestre João é um multiartista que esculpia madeira, pintava quadros e moldava cerâmica. Sua trajetória autodidata foi marcada por muitos erros e acertos, observação e teste. Hoje, ele é um Patrimônio Vivo do Estado de Alagoas, um mestre reconhecido e respeitado, professor da nova geração de artesãos.
Mestre João reforça que nenhum caminho é linear. É cheio de altos e baixos, erros e acertos. Generoso ao passar esse ensinamento a seus discípulos, ele transmite a riqueza do conceito do Mestre Artesão Brasileiro, destacando-se pelo repasse de conhecimentos fundamentais de sua atividade para novas gerações. A necessidade o fez criar uma oficina de arte, uma casa de exposição e criação, onde parte do princípio que a liberdade permite que cada um desenvolva sua própria voz.
Fonte: MOURA, Marta. DA TERRA O BARRO, DA ARTE A VIDA. Documentário [YouTube] 14 de dezembro de 2020.
Disponivel em: https://www.youtube.com/watch?v=jUteRqxWB9k
Texto: Mayara Fonseca