A Ilha do Ferro se localiza nas margens do Rio São Francisco, no estado de Alagoas. Com casas coloridas e pessoas sorridentes, é a moradia de diversos grandes artesãos, que criam um mundo imaginário através das esculturas em madeira de seres fantásticos e bordados das mais variadas cores. Ali se encontra a tradição e a renovação que transmitem a criatividade de um povo imerso em sua própria cultura e que gera vida através dos fazeres manuais. Cada casa um artesão, cada artesão uma potência de expressão artística.
A magia da Ilha do Ferro já se inicia em seu nome, afinal não é uma ilha, como muitos pensam. E não faltam teorias sobre o porquê de ilha e o porquê de ferro. Uma delas conta que o povoado as vezes fica isolado em época de chuva já que os rios que o contornam enchem, separando pela água esse território. Outros falam que a origem vem da ilha que fica em frente ao povoado, no meio do rio, e que antes se chamava Ilha do Ferro, porém, mudou de nome para Ilha do Anjos depois do naufrágio de um barco com diversas crianças, um acidente que apesar de muito antigo é vívido na história da região. Tem a versão de que Ferro vem do nome de uma família de fazendeiros que eram donos da região, outros dizem que existe muito metal nas terras que compõe o lugar. Entre outras teorias a certeza é que a imaginação e o mistério guiam a vida de seus moradores.
Mas se não se tem certeza sobre a origem do nome, a origem dos trabalhos em madeiras todos sabem como começou. O mestre Fernando Rodrigues dos Santos foi o primeiro artesão que deu maior visibilidade ao povoado, hoje já falecido, seus filhos e tantos outros artistas continuam seu legado. Sua prática herdou de seu pai, que fazia tamancos de madeira e outras peças, assim Fernado foi introduzido ao entalhe em e começou a fazer suas peças na oficina da família. Já mais velho iniciou sua produção de móveis de madeira que o fez ser reconhecido tanto no Brasil como fora. A sua forte influência no povoado provocou outros artesãos que seguiram seus passos e se engajaram na produção artística e de móveis.
Ilha do Ferro, legado criativo na nova geração.
No Ateliê Boca de Vento, seus filhos montaram um coletivo com outros artesãos e lá é possível encontrar diversos estilos, assim como a continuidade das práticas de Fernando. Outro grande artesão do povoado é Aberaldo, que é conhecido no Brasil todo por seus homens e mulheres de madeira. Em agosto, ele participou da exposição-feira Arte dos Mestres, organizada pela Artesol, que reuniu em São Paulo 20 mestres brasileiros vivos para mostrar suas obras. Um grande reconhecimento para este artesão, que conta com ajuda de seu filho na produção de suas peças. Em outra casa próxima encontramos Vavan, que cria seres místicos e coloridos, sua arte tem estilo próprio e inconfundível, apesar de o artesão ter começado depois de muitos ali já assume papel de destaque. Outro importante nome é o de Petrônio, que por ser membro de MST, com base agrícola e em assentamentos, carrega em si a preocupação ambiental e vê que sua arte não faz sentido se não cuidar na natureza. Por isso criou o movimento de cultivar e distribuir mudas de árvores nativas da região e minimizar o impacto ambiental. Além de sua obra trazer o grande peso artístico de seus seres imaginários, também levanta a bandeira da sustentabilidade, tão necessária. As madeiras mais usadas ali são a umburana e o mulungu, ambos típicos e também sofrendo problema de escassez, e muitos artesãos acabam encomendando-as de outras regiões. A primeira é usada pois apresenta durabilidade maior, não sendo tão fácil de ser atacada por pragas. Isto se deve a sua dureza e composição, o que necessita de um trabalho mais intenso do escultor que a escolhe. Já o segundo tipo, é mais macio e poroso, facilitando a manipulação e o entalhe, entretanto essa característica também é apreciada por insetos e fungos o que acelera sua decomposição.
Não se pode continuar falando da Ilha do Ferro sem destacar as bordadeiras da renda típica da região, o bordado Boa-noite, que tem referência a uma flor local. Em praticamente toda casa você encontra uma mulher bordadeira, que leva no seu dia a dia o hábito do bordar. Algumas delas se juntaram na Cooperativa de Bordadeiras Art Ilha, que com organização própria se juntam para bordar, trocar e viver. Com trabalho reconhecido atendem alguns projetos como da marca de roupas Cantão, do Rio de Janeiro.
Esse pequeno povoado é imenso em criatividade, o que demonstra que a força de um pode ser expandida para um território, que se fortalece na união e na identidade local. O artesanato fortalece outras atividades que geram renda para a comunidade, já que a Ilha do Ferro começa a se destacar como destino turístico justamente pela concentração de tantos ateliês e arte de qualidade. Assim surgem as pousadas feitas nas próprias casas dos artesãos ou os passeios de barco também feito por filhos e familiares, demonstrando que a cultura e artesanato estruturam a economia e a identidade de diversas regiões brasileiras.
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