
Artesanato sustentável como ferramenta de transformação social e ambiental
Entre tiras de borracha preta e retalhos de tecido colorido, Edy Ferreira Ribeiro move habilmente as mãos. Em atividade no ateliê coletivo em Canoas (RS) ela, na companhia de um grupo de mulheres, dão nova vida a materiais descartados, tecendo histórias em cada peça produzida. Edy, costureira, artesã e empreendedora, lidera o Grupo Canoa, um coletivo de 18 mulheres que escolheu o desafio do artesanato sustentável – transformando resíduos industriais em acessórios de moda únicos e combinando criatividade, consciência ambiental e identidade regional (crab.sebrae.com.br e ccmq.com.br). Sua trajetória, que começou modesta no sul do Brasil, hoje inspira comunidades, conquista prêmios nacionais e leva o artesanato gaúcho às vitrines do mundo.
Origens e trajetória no artesanato
A história de Edy no artesanato sustentável começou em 2007, quando uma iniciativa do Sebrae/RS, em parceria com a Prefeitura de Canoas e a Petrobras, semeou a ideia de aproveitar resíduos industriais como matéria-prima criativa. Na época, Edy Ferreira Ribeiro era conhecida por suas habilidades de costura, mas viu na proposta uma oportunidade de empreender coletivamente e gerar renda para outras mulheres de sua comunidade. Assim nasceu a Associação Canoa – batizada em homenagem à cidade de Canoas – reunindo moradoras da Região Metropolitana de Porto Alegre dispostas a “transformar em arte todo o material que vem do petróleo e é descartado pelas indústrias da região”, como definiu ela própria, então presidente do grupo.
No início, o desafio era duplo: dominar técnicas de criação com materiais pouco convencionais e vencer a desconfiança do público local. Muitas pessoas não acreditavam que borrachas de vedação, tecidos de guarda-chuva ou persianas pudessem se transformar em bolsas e colares elegantes. Persistente, Edy apostou na qualidade e no design das peças para mudar percepções. “Hoje não me vejo trabalhando com outro produto que não venha de reaproveitamento de resíduo”, reconhece ela, relembrando a virada de mentalidade alcançada com o trabalho do grupo (sebraers.com.br).

A trajetória do Grupo Canoa rapidamente ganhou impulso, e em poucos anos as criações de Edy chamaram atenção também fora do Rio Grande do Sul. Em 2010, suas peças foram destaque na 17ª Paralela Gift – importante feira de design em São Paulo – onde o artesanato sustentável gaúcho começou a mostrar sua cara inovadora ao país. Ali, Edy comemorou uma de suas primeiras grandes conquistas: iniciar a exportação de acessórios para Nova York. “Nossas peças têm qualidade para estar em qualquer prateleira das melhores redes americanas.”
Ao longo da década seguinte, Edy manteve o coletivo ativo e em expansão. De um núcleo original de poucas integrantes, o Grupo Canoa passou a contar com cerca de 20 artesãs dedicadas. Em 2012, aderiram ao Projeto Brasil Original, iniciativa do Sebrae Nacional que oferece capacitações em design, gestão e comercialização, refinando ainda mais as habilidades do grupo. Edy absorveu conhecimentos de identidade de produto, precificação e tendências, sem nunca perder de vista as raízes comunitárias de seu empreendimento.

“O artesanato me levou até lugares que nunca imaginei chegar, como na Espanha, onde fui convidada para mostrar o nosso trabalho. Vim de uma família simples, que enfrentou dificuldades, e hoje tenho o orgulho de poder levar a cultura brasileira para fora do país, mostrando o que somos capazes de fazer. As peças que criamos despertam o interesse e o desejo genuíno dos consumidores, que nem imaginam que a matéria-prima que usamos foi uma borracha de vedação, por exemplo”, conta Edy, que acredita que o reaproveitamento de resíduos no artesanato sustentável é uma solução que beneficia tanto meio-ambiente quanto às comunidades de artesãos.
Técnicas e materiais únicos: Impacto na comunidade local e no cenário artesanal sustentável
O processo de confecção é artesanal e colaborativo. Duas vezes por semana, as integrantes do Grupo Canoa reúnem-se no ateliê comunitário em Canoas para trabalhar juntas, compartilhando técnicas e histórias de vida, numa espécie de mutirão criativo. No restante do tempo, cada artesã dá seguimento à produção de casa, montando peças e preparando materiais no seu próprio ritmo – um modelo híbrido que permite conciliar o artesanato com outras responsabilidades familiares. Essa dinâmica flexível foi essencial durante a pandemia de 2020: mesmo com o ateliê fechado, Edy manteve o grupo unido virtualmente, provando a adaptabilidade do projeto.
Embora a trajetória de Edy esteja profundamente conectada à inovação em materiais, suas inspirações têm raízes culturais. A motivação inicial veio da realidade ao seu redor: Canoas é uma cidade industrial, e Edy via montanhas de resíduos sendo geradas nas fábricas locais. O ímpeto de “dar um destino nobre” a esses descartes surgiu tanto de uma consciência ambiental – evitar que borrachas e tecidos poluíssem o meio ambiente – quanto de uma sensibilidade social, ao perceber que aquelas sobras poderiam ser a matéria-prima de uma nova fonte de renda para muitas famílias.

O trabalho de Edy Ferreira Ribeiro exerce um impacto concreto na comunidade de Canoas e simboliza mudanças positivas no artesanato brasileiro contemporâneo. Localmente, a Associação Canoa tornou-se uma alternativa de sustento para mulheres que enfrentavam barreiras no mercado de trabalho tradicional. Integrantes aposentadas, donas de casa ou em situação de vulnerabilidade encontraram no coletivo não apenas uma fonte de renda complementar, mas também um círculo de apoio mútuo. A cada bolsa vendida ou colar encomendado, há ganhos que vão além do financeiro: autoestima fortalecida, senso de propósito e orgulho em ver seu artesanato apreciado por clientes de diferentes lugares. Num estado onde 78% dos artesãos cadastrados são mulheres, principalmente atuando de forma autônoma, a experiência coletiva do Grupo Canoa oferece um modelo inspirador de cooperação e empoderamento feminino.(gauchazh.clicrbs.com.br)
A comunidade de Canoas como um todo também se beneficia. Ao transformar lixo em luxo, Edy contribui para a consciência ambiental local. Empresas da região passaram a enxergar valor nos próprios resíduos, sabendo que podem ser insumo para artesãs talentosas, ao invés de um passivo ambiental. Esse diálogo entre indústria e artesanato, ajuda a criar uma economia circular em pequena escala: já foram reciclados cerca de 50 quilos de borracha por mês em determinados períodos de produção, quantidade significativa de material que deixa de poluir aterros ou rios (guiadapesca.wordpress.com).
Sua oficina se tornou ponto de referência em Canoas, um local onde gestores públicos, pesquisadores e outros artesãos podem testemunhar o poder transformador do artesanato. No cenário mais amplo do artesanato brasileiro, Edy Ferreira Ribeiro destaca-se como pioneira na integração entre artesanato tradicional e design contemporâneo sustentável. Se por um lado ela honra a essência do feito à mão, por outro ela rompe com a ideia de que artesanato gaúcho resume-se a cuias, tricô de lã ou couro cru típico da cultura pampeana. Ao trabalhar com resíduos industriais e moda, Edy abriu caminho para que o artesanato fosse visto também como inovação. Seu coletivo surgiu em paralelo a outros grupos do RS – como as Redeiras de Pelotas, que utilizam redes de pesca e escamas de peixe, ou o Ladrilã na Serra, que trabalha com lã ovina – todos apoiados pelo Sebrae dentro de uma visão de economia criativa. Essa movimentação colaborativa gerou uma espécie de “nova onda” do artesanato gaúcho na última década, com forte apelo sustentável e entrada em nichos de mercado antes inexplorados. A marca Canoa, construída coletivamente, colocou o nome da cidade e do Estado no cenário do artesanato mundial, como orgulhosamente ressalta um artigo do Sebrae/RS. Hoje, peças criadas no pequeno ateliê comunitário já enfeitam vitrines em Nova Iorque, Berlim, Paris e outras capitais, conectando a arte feita no Rio Grande do Sul a consumidores de diferentes culturas.

Premiações, exposições e reconhecimentos

A jornada de Edy Ferreira Ribeiro coleciona prêmios e distinções que validam a importância de seu trabalho. Em 2016, apenas nove anos após a fundação do grupo, o Projeto Canoa foi reconhecido no Prêmio Sebrae Top 100 de Artesanato, sendo premiado como um dos 100 empreendimentos artesanais mais competitivos e inovadores do Brasil. Essa premiação – considerada o “Oscar do artesanato brasileiro” – avalia critérios como qualidade do produto, responsabilidade ambiental, compromisso cultural e boas práticas de gestão. Estar entre os vencedores sinaliza que Edy atingiu excelência não só na criatividade, mas também na condução do negócio coletivo. Anos depois, em 2022, Edy e suas colegas conquistaram novamente o Prêmio Top 100, em sua 5ª edição, desta vez com destaque especial para o apelo sustentável do projeto (sebraers.com.br). O Grupo Canoa figurou entre os cinco representantes do Rio Grande do Sul premiados naquele ano, ao lado de iniciativas parceiras como as Redeiras de Pelotas – mostrando a força do artesanato gaúcho no cenário nacional, avaliou Edy ao receber a distinção, com a humildade de quem divide o mérito com toda a equipe.
Esses prêmios trouxeram não apenas troféus, mas oportunidades: os vencedores do Top 100 ganham visibilidade em catálogos comerciais, direito de uso de um selo de qualidade por três anos, e participam de rodadas de negócio com compradores do Brasil e do exterior. Edy aproveitou cada chance. Suas criações integraram mostras coletivas e vitrines especiais, como um showroom montado no Centro Sebrae de Referência do Artesanato Brasileiro (CRAB), no Rio de Janeiro, onde peças do Grupo Canoa ficaram expostas para lojistas internacionais após a premiação. O CRAB, inclusive, se tornaria palco de outra honraria: em 2024, Edy Ferreira Ribeiro foi uma das artesãs homenageadas na exposição “Solo Criativo: uma homenagem aos artesãos do Brasil”, sediada nesse centro cultural. A mostra reuniu mestres de várias regiões, celebrando a diversidade do artesanato nacional, e destacou Edy ao lado de nomes consagrados como Mestre Getúlio Damado (RJ) e Mestre João das Alagoas (AL). Na apresentação da exposição, lá estava Edy representando o Sul: “Edy e o Grupo Canoa transformam resíduos industriais em acessórios únicos. Desde 2007, o grupo trabalha com reaproveitamento, dando nova vida a materiais descartados pela indústria”. Ver seu nome e história incorporados a um panorama dos grandes artesãos do Brasil é, para Edy, a confirmação de que aquela semente plantada anos atrás floresceu além do imaginável. (crab.sebrae.com.br)
Se quiser saber mais entre em contato pelo Instagram: https://www.instagram.com/grupo_canoa/
Bibliografia
AGÊNCIA BRASIL. Estudo aponta que 95% dos artesãos se adaptaram às vendas na internet. Brasília: Agência Brasil, 18 mar. 2022. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br. Acesso em: 30 mar. 2025.
CASA DE CULTURA MÁRIO QUINTANA. ‘Pôr-se em arte’ é o novo projeto a ocupar a Vitrine CCMQ + RS Criativo. Porto Alegre: CCMQ, 19 jul. 2023. Disponível em: https://ccmq.com.br. Acesso em: 30 mar. 2025.
CRAB SEBRAE. Solo Criativo: Homenagem ao Artesão. Rio de Janeiro: Blog do CRAB, 11 jul. 2024. Disponível em: https://crab.sebrae.com.br. Acesso em: 30 mar. 2025.
GAUCHAZH. Artesãs do Sul transformam resíduos em objetos de moda. Porto Alegre: GZH, 17 nov. 2022. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br. Acesso em: 30 mar. 2025.